Por que uma sociedade que apela tanto para o sexo produz tantos castrados?!
Cada vez mais nos convencemos que isso se deve a um outro chamamento seu, tão importante ou até mais: a supervalorização da gula. “Divina gula!” “Bendita gula!” “Santa gula!” Como se gula seja sinônimo de bem se alimentar! Pelo contrário, por não sentir o que come, o guloso desconta na quantidade e, mesmo assim, nunca se satisfaz. No máximo diz: “já tou cheio!”.
Mas a gula é uma produção cultural. Ninguém nasce guloso. A criança é induzida, de várias formas, a se tornar um jovem e um adulto guloso. “Olha o aviãozinho!” “Abre a garagem pro carrinho entrar!”. “Se você não comer tudo é porque não gosta da mamãe que fez esta comidinha com tanto carinho!” “Se você comer tudo, depois ganha um chocolate.” E daí por diante. Atualmente até o acesso à internet tem sido atrelado ao comer tudo e de tudo.
Alimentar-se deixou de ser uma relação naturalmente determinada pelo prazer, que nos levaria a fruir o objeto da relação, neste caso, os alimentos, tal como nos ensinava a Sabedoria Popular. Tornou-se, pelo contrário, uma ação movida por receitas e dietas, não ultrapassando a dimensão do alívio e determinada pela lógica do prêmio e/ou castigo. Pelo alívio não se sente a relação e, portanto, não se tem medida da satisfação. Com isso, reprime-se o paladar, primeira e decisiva etapa no processo de nossa castração!
A questão, porém, não é só essa. É mais. Precisamos (nós, agentes desta cultura) aprofundar essa castração. E a melhor forma de fazê-lo é nos aproveitarmos desse instinto de sobrevivência e impedir a criança de reconhecer, conhecer e respeitar seu próprio desejo. Impomos a ela nosso ritmo, nosso horário e nossas escolhas. Fazendo isso, temos a convicção de que teremos um adulto machão/machona, ou até mesmo assexuado, e totalmente dependente do outro e do meio. É a lógica da heterorregulação! Afinal, liberdade é uma realidade que não pode passar da dimensão do discurso. Precisamos de indivíduos escravos da cultura e do mercado!
Quem não aprende a sobreviver certamente também não saberá viver, muito menos amar. “Quem não tem paladar nada tem para dar.”