Entrevista Caderno Bem Vivar – EM 2007

Superação do cio biológico: A história humana (individual e coletiva) é determinada pela superação do cio biológico da fêmea em busca do cio psicobiofísico.          A Sabedoria Popular sempre considerou a dimensão da Energia Material Humana na sua visão de mundo.          O afluxo sanguíneo é que gera a potência genital, seja no homem, seja na mulher.          As doenças do corpo e da mente são alimentadas pela energia material humana mortal/negativa.          Fusão genital é o modelo de relação sexual onde homem e mulher vivenciam sua potência genital.          O modelo de vida (individual ou coletiva) da auto-regulação pressupõe a consciência e o enfrentamento da realidade do pecado.          A noção de pecado originária da Sabedoria Popular é porque essa sempre considerou a dimensão da energia material humana na sua visão de mundo.          Para a Sabedoria Popular pecado é a transgressão de alguma lei que rege a natureza humana.          Potente é quem, mais do que em suas capacidades, tem consciência de seus limites e os respeita, buscando sua superação.          A vivência da virtude nos faz potente e a vivência do pecado nos deixa impotente para amar e gozar a vida.          Não existe pessoa desorganizada: uns se organizam para ter paz, outros para ter aflição.

Domingo, 02 de dezembro de 2007, o jornal Estado de Minas publicou, em seu caderno Bem Viver, a entrevista do presidente da SER em SI sobre o livro “Racionalidade da Sabedoria Popular: energia material humana e sexualidade.”

Se você não teve oportunidade de lê-la, segue abaixo a sua íntegra.

ENTREVISTA

Fábio Madureira

Escritor aborda males da contemporaneidade, relacionando energia humana e sexualidade

Ellen Cristie

Sabedoria Popular

Jackson Romanelli/Divulgação – 29/10/07

Fábio Madureira lançou em outubro o livro Racionalidade da sabedoria popular – energia material humana e sexualidade, no Palácio das Artes, no Projeto Sempre um Papo. Na obra, ele destaca que o ser humano só conseguirá vencer a angústia e a infelicidade dos tempos modernos se reconquistar, coletivamente, a consciência sobre a própria energia material e recuperar o conhecimento gerado pela sabedoria popular, desprezada pelo modelo de racionalidade mecânica que hoje impera como expressão máxima da cultura patriarcal. Fábio Madureira é formado em letras pela Universidade Federal de Minas Gerais (UFMG) e especialista em educação. Em entrevista ao Bem Viver, ele fala sobre os problemas que afetam o ser humano e sobre a organização não-governamental Ser em Si, que criou recentemente.

O título de seu livro relaciona o que você chama de racionalidade da sabedoria popular com a energia material humana. O que significa isso?

Até hoje, a sabedoria popular tem sido usada, geralmente, como fonte de produtos exóticos, de manifestações folclóricas e de inspiração para chistes e piadas. Em outras palavras, a sabedoria popular não tem sido levada a sério. Pelo contrário, percebe-se um movimento no sentido de desqualificá-la e até de ridicularizá-la. Neste livro, tento mostrar que ela é detentora de um saber bastante atual, porque baseado numa racionalidade mais avançada do que aquela que hoje nos domina. A racionalidade da sabedoria popular nunca desprezou a dimensão de energia que existe na matéria. Já a dominante, só depois de Einstein reintroduz essa dimensão na sua visão e, até agora, praticamente apenas nas áreas das ciências exatas. Nas áreas do comportamento humano, continua a prevalecer a noção mecânica de matéria. Basta analisarmos os principais conceitos que compõem hoje nossa visão de mundo sobre indivíduo, família, nutrição, doença, saúde, vida, morte, prazer etc. Ninguém nega mais, pelo menos teoricamente, que matéria é uma relação entre massa e energia. Só que, na prática do dia-a-dia, como seres humanos materiais, temos desconsiderado essa dimensão de energia existente na matéria. É a essa dimensão da matéria que chamo de energia material humana. Sua importância está em que ela é a matéria-prima de todos os nossos comportamentos: orgânicos, motores, cognitivos, intelectivos, afetivos e até dos espirituais. Conseqüentemente, se não estamos sabendo lidar com essa dimensão da realidade, certamente estaremos dando com os burros n’água na maioria de nossas opções de vida. Inclusive nas nossas relações com as demais dimensões de energia: a dos astros, das águas, dos símbolos, das formas, dos números, das cores, dos alimentos, dos outros níveis de vida e da própria realidade sobrenatural.

E a sexualidade? Onde entra nesse processo?

Essa energia material humana está diretamente relacionada com a nossa sexualidade. É a partir dela que colocamos em prática nosso instinto de preservação da espécie. E é aqui que produzimos novas vidas e podemos reproduzi-las em novas vidas. Só que, como perdemos a noção dessa energia existente na matéria, temos transformado a sexualidade humana numa nau sem rumo. E assim, diuturna e sistematicamente, agredindo nossa própria natureza, temos transformado a energia vital, que deveríamos estar produzindo, em energia mortal ou negativa. Mas, como não aprendemos a nos desfazer dela (coisa que a sabedoria popular sabia!), ela passa a ser a matéria-prima de todos os nossos comportamentos. E aí vem o desastre. Procuramos saúde e produzimos doenças. Procuramos amar e acabamos por odiar. Procuramos a verdade e construímos um mundo de alienação, fantasia e ilusão. Procuramos viver e terminamos por “inviver”, acomodando-nos num mundo de um eterno faz-de-conta.

A quem é destinada a sua obra?

Esse livro é destinado a todas as pessoas que estejam buscando um novo modo de vida. Não é livro de auto-ajuda, no sentido corrente. Só vai se beneficiar de sua leitura quem estiver procurando sua própria verdade. Sua leitura incita uma constante reflexão. Por outro lado, porém, ela não exige nenhum conhecimento prévio. Qualquer um pode lê-lo.

Como lidar com a angústia da contemporaneidade e superá-la?

Recuperando essa dimensão da realidade material e aprendendo a lidar com ela, deixamos de ser objeto e passamos a ser sujeito nas nossas relações. Porque essa dimensão não tem nada de abstrato. Apesar de ser energia e, portanto, normalmente invisível, ela é bastante concreta. Todos nós sabemos dela e a sentimos, seja pelo paladar, pelo olfato, pelo tato. No seu estado vital, ela é calorosa, perfumosa, oleosa e doce. Por isso, toda relação sexual saudável deveria produzir uma energia com essas características. Como, entretanto, nossa evolução se tem dado no sentido da repressão ao desejo, terminamos por produzir um modelo de sexualidade agressor de nossa própria natureza. A energia resultante dessas agressões tem características exatamente opostas: frígida, fétida e seca. É a tal da energia material humana negativa ou mortal. Nossos atuais comportamentos e hábitos têm sido no sentido de armazená-la e incorporá-la, e não de dela se desfazer. Basta que nos lembremos dos cosméticos, desodorantes, anestésicos, analgésicos e tudo mais que vamos criando para poder conviver com ela. E aqui está a base de toda a angústia dos nossos dias. Vamos fazer amor e produzimos morte. Uma morte que vai impregnando nosso ser, gerando doenças físicas e mentais. Pior, não sabemos de onde vem, e continuamos a produzi-la e reproduzi-la. E, além de produzi-la, a transmitimos sistematicamente. E pior ainda, geralmente os recebedores são pessoas que dizemos amar. Quer angústia maior do que essa?

Você diz que o mundo é gerido pelo princípio do alívio ou pelo império das bulas. A sociedade está doente?

Não sou eu que o diz. Eu apenas concordo e aprofundo. O próprio saber dominante já cunhou um termo que diz tudo: normopatia. Para mim está aqui a origem de todas as demais doenças. É o normal que se acredita sujeito de amor e, por ignorância, termina por produzir e reproduzir apenas morte. Morte para si e para os seus. Principalmente para as crianças. Não nos esqueçamos de que toda energia é sistêmica e, como tal, é transmitida, recebida, armazenada e processada. De repente, algo que nunca lhe fez mal passa a fazer. E você não sabe por quê! Assim, nossa vida passa a ser uma corrida atrás do prejuízo. Desaprendemos, inclusive, o que seja prazer. Ou melhor, passamos a chamar de prazer algo que não passa de alívio. Porque prazer é fruir o gostoso (processo). Alívio é se desfazer de algo que incomoda (produto). Pode até gerar bem-estar, mas será momentâneo e não nos deixará satisfeitos e em paz. Por isso, temos que apelar para as receitas dos outros. E nossa “vida” passa a ser um contínuo processo migratório de receituários. Deixamos de ser senhores de nós mesmos e passamos a ser escravos dos entendidos. Nossa dimensão de gozo, então, nem se fala! O gozo só é possível no mundo do prazer. E hoje nem sabemos mais o que é prazer!

Você criou uma organização não-governamental (ONG) cujo nome é Ser em Si. Como funciona a ONG, onde está localizada e que objetivos tem?

A Ser em Si tem três áreas de atuação: o movimento de afirmação da sabedoria popular (Masp), o centro de estudos da energia material humana (Cpod-ce) e o movimento de afirmação da referência feminina (Marf). Seu principal objetivo é socializar o conhecimento já existente sobre a energia material humana e incentivar seu aprofundamento. Para isso, estaremos, a partir do início do ano que vem, lançando dois concursos públicos: um de monografia ou tese e o outro de histórias em quadrinhos. A idéia é premiar os dois melhores trabalhos dessas categorias, que incorporem e dissertem sobre a temática da energia material humana. Além disso, desenvolvemos as seguintes atividades: o grupo do amor verdadeiro (Grav): grupos de reflexão, estudos e depoimentos que auxiliam as participantes na transformação de sua visão de mundo; a terapia concreta, que visa ao enfrentamento das questões individuais a partir da reflexão coletiva; a introdução da energia material humana (curso básico); a lobosofia, prática que visa a liberação das cargas de energia negativa, a partir de relaxamento e conscientização energético-corporal; tocando raízes, encontros periódicos para curtir as músicas que expressam a sabedoria popular.

Você acha que a solução para a sociedade necessariamente passa pelo meio ambiente?

Não diria a solução. A sobrevivência, sim. Já temos vários sinais de que, se não voltarmos a ter uma visão ecológica (a sabedoria popular sempre a teve), o planeta deixará de ter as condições necessárias para a sobrevivência da espécie humana. Contudo, essa nossa histórica e desastrosa relação com o meio ambiente pode nos recordar um ensinamento da sabedoria popular: a natureza não revida, vinga. Só agora ela começa a dar os sinais de sua vingança. Ou mudamos nossa maneira de nos relacionarmos com ela ou seremos esmagados por ela. Podemos e devemos nos aproveitar desse ensinamento. Se a tecnologia é extensão do próprio homem, e até agora ela só existe no sentido de agredir a natureza, é porque temos também agredido a própria natureza humana. Talvez seja essa a grande lição que devemos tirar do prenúncio dessas possíveis catástrofes naturais: estamos também agredindo sistematicamente nossa natureza humana.

O que quer dizer egologia e qual a relação com ecologia?

Pelo menos teoricamente, todo mundo admite que, tanto o egoísmo quanto o egocentrismo, são um mal para a sociedade. Maior mal, porém, é o ser humano deixar de ser sua própria referência. Quando isso ocorre, ele passa a pôr a referência no outro. E aí vem a inveja, a competição e todo tipo de desamor! A noção de egologia vem resolver esse vácuo conceitual. Egológico todo indivíduo deveria ser. E na medida em que o fosse, tudo mudaria. Porque egológico é, antes de tudo, o indivíduo que conhece e respeita as leis que regem a própria natureza humana. E se assim o faz, necessariamente, vai respeitar o meio e a natureza que o cercam. Infelizmente, porém, não podemos afirmar que a recíproca seja verdadeira. Nem todo ecológico é egológico. Basta analisarmos nossas relações com a sexualidade e até com nossa forma de nos alimentarmos.

Falando sobre questões de gênero, você concorda com vários especialistas que dizem que a mulher está a anos-luz, emocional e profissionalmente, dos homens, e que elas são o futuro da humanidade?

Profissionalmente, parece que os indicadores apontam para esse lado. E acho que isso deve ser creditado ao movimento feminista. É inquestionável o avanço que a mulher conquistou no mundo do trabalho. Fato que o capitalismo até agradece. Só que esse fato, somado a outros que a mulher ainda não enfrentou coletivamente, tem atrapalhado bastante a mulher na sua busca, principalmente enquanto fêmea. Não podemos nos esquecer de que vivemos numa sociedade patriarcal e que todo o conhecimento que a sustenta é, portanto, patriarcal e machista. Principalmente aquele que pretende ser instrumental para as mulheres. Até hoje prevalece a ideologia de que a referência sexual humana é o falus erectus. E, para mim, a tomada do clitóris como referência da mulher é um aprofundamento dessa ideologia machista. Quando a mulher redescobrir sua verdadeira referência de fêmea e passar a vivê-la conscientemente, numa postura de sujeito de uma relação em que seu companheiro também seja sujeito, aí, sim, estaremos vivendo e construindo uma nova humanidade.

Serviço : Ser em Si